sexta-feira, novembro 25, 2005

Sabe o que eu queria...

Eu queria estar ao seu redor, te acomodar em meus braços e me sentir toda em você. Rodear minhas mãos nos seus cabelos ralos e beijar seu rosto assim...bem de leve.
Eu queria ouvir aquela música que não fala de nós dois, mas que escolhemos para ser nossa mesmo assim. Eu queria ir aonde você fosse e não perder um só minuto do seu dia. Não importa que ele seja enfadonho, normal, o meu também é, e mesmo assim eu queria que você o conhecesse também.
Daí eu ficaria te olhando em silêncio, quietinha, para não te atrapalhar. Eu ouviria a sua voz me dizer que está tudo bem, ou que o preço da gasolina está muito alto, ou que o trânsito está péssimo e você teve um dia horrível, sei lá. Qualquer coisa que fizesse vibrar suas cordas vocais estaria bom.
Sabe, eu estava querendo iniciar uma conversa meio sem sentido, só para ver seu riso irônico para cima de mim. Eu estava pensando em deitar e cochilar um pouco do seu lado, aproveitar que você está lendo esse livro que eu não gosto e me esticar mais. Então você começa a mexer no meu cabelo e eu durmo, só um pouquinho, só para relaxar.
Escuta, eu queria te dizer que eu tenho agora um monte de vontades confusas: barra de chocolate branco com café, pizza com Milk Shake de morango. Ou vontade simples como deitarmos no chão, com os pés em cima do sofá, ouvindo música clássica, Mozart, Chopin, Strauss, Bethoven, não importa. Não importa nem se não tiver música alguma.
É que eu queria a coisa comum, do dia-a-dia. O creme dental apertado pela metade, a toalha molhada em cima da cama, o banheiro todo encharcado, seus pés roçando nos meus antes de dormir e dormir abraçado, claro.
Eu queria o beijo de boa noite para encerrar bem o dia, selando aquilo que eu desejo para nós dois, mesmo inconscientemente, mesmo não revelando isso para você. Era só isso que eu queria.

terça-feira, novembro 22, 2005

Mulher super poderosa


Ainda recordava os instantes passados como obra de grande valor. Lembrava com certo orgulho das suas palavras, da sua honra defendida tão gloriosamente. Felicitava-se por sua coragem. Remoía as expressões usadas, o tom da voz, as feições endurecidas. Tinha um certo prazer nessas recordações. Já pensava no que diria da próxima vez. Seria mais enérgica, implacável. Ameaçaria, destruiria, amaldiçoaria. Perdeu-se nesse exercício mental bons minutos da sua manhã de segunda-feira.
Ainda orgulhosa de si mesma, já preparava o discurso para a nova empreitada, que não tardou a acontecer. Só que dessa vez o tom e a energia das palavras foram amenizadas pela voz suave e compreensiva do outro lado da linha, mas não o suficiente para aplacar sua ira previamente decorada.
Quando acabou estava outra vez orgulhosa de si. Não dizia nada a ninguém. Saboreava sozinha aquele seu momento sublime de mulher super poderosa, que nada teme e que sabe se impor. Era assim, um mulher bem resolvida. Sabia lidar com os perigos, mesmo que eles estivessem a quilômetros de distância. Não importa, o que vale é que ela não se dobra.
E foi começar o dia imperiosa após o duelo telefônico travado nas primeiras horas da manhã. Era uma dona de casa, usava roupas surradas, mas não se enganem, pois ela sabe fazer do seu rolo de macarrão uma arma letal.

sexta-feira, novembro 18, 2005

Everybody say I love you


Da janela do quarto olhava para o lado de fora, tudo ainda calmo, sonolento. Era manhã e pela janela via-se bem as ruas, mas seu pensamento estava mergulhado em si, engolido, entranhado, vagando por suas lembranças, refletindo, gostando, sonhando.
Analisava-se como outra pessoa. Ainda há pouco andava tão grave e sisuda como somente a tristeza consegue ser e tão absorta quanto pede a seriedade. Era séria porque os percalços da vida são sérios. Mas agora não mais, estava tranqüila, serena. Vinha feliz, uma felicidade reconquistada a custa de minutos contados no tempo.
Virou-se para dentro e observou o corpo esticado em cima da cama ainda em repouso. Olhou, meditou e sorriu uma vez mais. Chegou perto para ver se dormia mesmo. Constatou que sim; dormia profundamente.
Ficou imóvel e contemplativa ainda durante alguns instantes a pensar em todo o passado como algo muito além da lembrança. "Como eu te amei!".
Corrigiu. Achou a frase muito pretérita. Correu para transformá-la em presente "Com eu te amo".
E ama mesmo. Ama com todas as letras que compõe e decoram a palavra amor. Ama conjugado, analítico e incondicionalmente. Ama apenas por amar, assim como os verbos intransitivos que se bastam. Ama intransitivamente. Ama sem pedir o troco, ama sem ter respaldo, ama de mãos abertas e olhos fechado. Ama grande, profundo, complexo. Ama assim mesmo, como só a palavra amor consegue ser amada.
Lembrou do pedido na noite anterior. O pedido de permanência que o outro quase lhe implorava. Pedido desnecessário. Pedido que não teve resposta. E nem precisava. Afinal, ele nunca havia arredado um pé de dentro do seu coração. Ele nunca havia saído do seu lado, continuava com os pés colados nos seus. Então, para que pedir?! Bastava ficar. Já era de casa. Pensou que algumas coisas na vida são assim, meio incrédulas e nem se dão conta de que não precisam de uma resposta formal para serem aceitos, como aquele pedido disforme.
Saiu do quarto ainda com o riso a cortar-lhe o rosto, achando graça no mundo. Não fazia grandes reflexões, apenas ria, um riso grave e constante. Ria por ria, bem como amava por amar. Ria com o coração. Tomou seu café e foi encarar o mundo que agora parecia pequeno e pouco valente.
Pensou mais uma vez em si mesma e na sua felicidade. Lembrou do corpo esticado na cama "deixe ele repousar". E saiu a repetir a famosa frase do escritor que havia lido no dia anterior : Ao vencedor as batatas!

Caríssimo,
Desculpe o meu inglês macarrônico, mas é que não encontrei outra maneira de começar este post.

domingo, novembro 13, 2005

Time


Tempo sobrando. Tempo demasiadamente ..demais.
Tempo demais para pensar, comer, ouvir e ler besteira e coisa séria também. Tempo sobrando para chorar aquilo que não foi, aquilo que esperamos mesmo sem saber porquê. Tempo demais para estar grudado, para ouvir consolos e reclamações. Tempo demais para procurar o que fazer, ficar deitada olhando para o teto, contanto as imperfeições da parede. Tempo demais para ler vários livros pela metade, para fazer planos para o sempre incerto futuro. Tempo demais para carregar no braço, para escolher para quem olhar, para suspirar. Tempo demais para ficar pensando, inventando histórias, desculpas, pretextos, mentiras. Tempo demais para fazer novos amigos, rir novas gargalhadas, ficar sentado jogando conversa fora. Tempo demais para ter raiva, para guardar mágoas, para chorar fracassos. Tempo demais para achar que o tempo passou e você não pegou o trem, mesmo estando na estação. Tempo demais para achar que virou as costas para o certo, o correto, o mais sensato. Tempo demais para sentir a sensação de vida e fortuna passar na sua frente e você não consegui correr para alcançá-la. Tempo demais para ter ciúme, um pouco de inveja, muita saudade, vasculhar armários, gavetas, fotografias apenas para ter a certeza de que um dia você fez parte de alguma coisa. Tempo demais para ver antigos amigos, falar ao telefone, vasculhar a internet. Tempo demais para querer engolir tudo de uma única vez, mesmo sabendo que a quantidade de alimento, apesar de triturado, não passa pela garganta. Tempo demais para vaguear pela imaginação, para ver novelas, suspirar com romances mamão com açúcar. Tempo demais para fazer yoga, faxina, brincadeira de criança. Tempo demais para ficar se olhando no espelho e perceber que a vida está consumindo suas células, que algumas rugas indiscretas já querem dar sinal de vida. Que o cabelo muitas vezes implica e não ajuda a melhorar a alto-estima. Tempo demais para ser uma menina má, errante, louca e que tenta ser impiedosa. Tempo demais para machucar corações, agir sem pensar, buscar arrependimentos, sofrer novas dores. Tempo demais para dizer muita coisa e mesmo assim preferir ficar calada. Tempo demais para olhar o céu azul, límpido, sem uma única nuvem para manchar sua existência. Tempo demais para pensar se se deve, ou não, ir à praia e tirar essa cor de cerejeira mofada.
Tempo demais para dormir até mais tarde, para acordar sempre tarde, para começar o dia pensando no que não vai fazer, planejando mil coisas que serão mantidas apenas até o próximo pensamento. Tempo demais para querer fazer parte do mundo dele, para querer estar perto dele. Tempo demais para se ter muita idéia, muitos assuntos a serem explorados, muitos projetos de se dar bem.
Tempo, tempo sempre ele, quando não nos escraviza nos derrota. Lufa nos nossos ouvidos que está do nosso lado, mas sempre pisa em nosso sapato nos fazendo cair.
Ah tempo! Se eu pudesse acabava com você, mas aí não teria graça, pois eu também já estaria no fim.

quarta-feira, novembro 09, 2005

Sala, cozinha e quarto


Naquele hall, sentada no banco esperando você descer as escadas com seus passos firmes de dono do mundo, reparei seu ar imponente, suas feições delicadas, feições de quem sempre teve a vida como aliada e de quem dela pouco sofreu, ou teve poucos motivos para se queixar ou se deixar amargurar. Feições de quem tem a vida sob forte segurança e por isso mesmo, por ser complemente dono de si, se deixa levar para onde desejam os ventos.
Contemplei e desejei ser a senhora desse seu mundinho, ou pelo menos ter uma chance de desbravá-lo se pudor, sem temer os desafetos, as avalanches emocionais que nele se infiltram feito ar nos pulmões.
Daria meu reino de chocolate só para ter o prazer de entrar na sua vida e nela se instalar muito dona da situação e me esparramar sobre você, como gata saliente esperando o dono vir acariciar seu pêlo, tomar conta do seu precioso PC com todas aqueles arquivos meticulosamente organizados, tão diferentes dos meus, tão diferente de mim. Tomar conta da poltrona, dos seus armários e fazer você precisar insuportavelmente da minha presença, sentir a minha falta quando eu não estiver por perto. De se incomodar com a minha desordem, com a minha total falta de organização e conduta, de procurar minhas mensagem loucas, confusas, descompassadas na caixa postal, ou minhas "mentiras sinceras" que sempre tenho tão bem planejadinhas.
Mas eu ainda não sou a dona do seu mundo. A cadeira do lado direito da sua mesa ainda não me pertence , os seus livros e cds ainda continuam intactos e não sofreram os meus rompantes, nem foram colocados fora de ordem. Ainda não brigamos pelo lado da cama que mais nos agrada ou pelo nosso espaço no guarda-roupa. As louças, graças à minha ausência, ainda estão em perfeito estados de conservação. Só eu e minha mania de estragar tudo, até objetos, poderia destroçar sua vida dessa maneira.
Então, enquanto isso não acontece. Enquanto você não me pergunta se eu quero comprar uma passagem só de ida para um futuro incerto ao seu lado eu fico com sua imagem parada na minha frente olhando nos meus olhos e perguntando:
- Tava pensando em que?
- Nada. Tava só pensando na vida.

sábado, novembro 05, 2005

Se

Se eu fosse como você, não estaria nesse estado agora, chorando todas as dores do mundo, tendo peninha de mim mesma.
Se eu fosse como você, arrancaria forças de não sei de onde e partiria para a vida ao invés de ficar choramingando os fracassos.
Se eu fosse como você, tomaria as rédeas da situação e não colecionaria derrotas.
Se eu fosse como você, seria de bem com a vida e não uma mulher dramática, tendo crises de adolescência tardia.
Se eu fosse como você, brigaria com o mundo para ter o direito de ser o que sou e não ficaria criando personagens, ou um mundo irreal para dissimular minha verdadeira face.
Se eu fosse como você, me atreveria a dar um salto maior do que a perna, não teria medo do imprevisto, da falta de certezas.
Se eu fosse como você, não ficaria sentada vendo a vida passar e me dizer "olá" e ir embora, para depois reclamar que não tive oportunidade.
Se eu fosse como você, saberia que o amor não vai bater na minha porta, com um buquê de rosas e um lindo cartão dourado se eu não sair à rua atrás dele e convidá-lo para me visitar.
Se eu fosse como você, não teria medo do quarto escuro, da casa vazia, da noite sem estrelas.
Se eu fosse como você, falaria mais, seria mais amigável e não transformaria minha vida familiar num monólogo.
Se eu fosse como você, não esperaria a noite chegar ou o dia nascer para dizer Eu Te Amo.
Então eu não conheceria a solidão, o medo do vazio. Eu diria mais vezes palavras afáveis, faria mais pessoas felizes e sorridentes e não ficaria pedido a Deus a todo tempo uma segunda chance para ser feliz.

quarta-feira, novembro 02, 2005

Hoje

Hoje é um daqueles dias em que as horas demoram a passar além do normal. Aqueles dias mofinos em que o corpo custa a se erguer da cama e tudo ao redor ofusca. Aqueles dias em que a alma está cansada de não sei o que e tudo se resume a uma cor cinza.
Cinza, pálido, sem graça, sem força, sem ânimo nem coragem para dar sequer um passo adiante.
Hoje é um daqueles dias em que o quarto é, ao mesmo tempo, refúgio e prisão. São dias em que não queremos ser o que somos e sempre achamos que poderíamos ter feito mais e melhor; poderíamos ter entrado à esquerda e não à direita, ter dado um passo para trás ao invés de seguir adiante. Um dia sem conforto, com cheiro de lágrima e voz quase sussurrada.
Esse foi o dia de hoje. Parado como o clima do lado de fora. Fiquei cozida à minha cama, olhando para o teto e tentando pensar em alguma coisa boa que pudesse afastar esse sentimento ruim. Como não consegui tal intento, achei melhor levantar, reunir forças e encará-lo.
Então, mãos à obra. Saí da cama, penteei o cabelo, me olhei no espelho e não gostei do que vi do outro lado. O rosto inchado de tanto chorar na noite anterior deixou seqüelas visíveis.
Permaneci ainda algum tempo assim, frente ao espelho, olhando para mim mesma sem conseguir me enxergar naquela visão, sem me reconhecer naquela imagem. O que aconteceu com a doce e alegre garotinha do passado, que já acordava sorridente, falante, alegre? Ela se transformou numa mulher meio fria, que acorda de mal-humor e resmunga algumas palavras com alguém. A menina sapeca que era abraçada pelo mundo virou a mulher do espelho, que hoje procura braços que queiram abraçá-la.
Devia ter ficado na cama, devia ter virado para o lado e dormido, mas não. Hoje eu acordei com o mundo nas costas fazendo força para me derrubar, mas ele não precisava ter debandado tanta força, eu já está caída mesmo, senão física, mas de espírito.
Nem mesmo os meus amigos imaginários vieram me visitar, acordei sozinha, e assim passei o restante do dia. Fria, seca, chorosa. Os olhos brilhantes do passado não existe mais. Eles cederam o lugar a mulher cheia de aborrecimentos e com a alma mergulhada na tristeza.
Se existem outonos de alma, estou nessa estação. Querendo ver o sol e ele se escondendo. Mas eu não quero brincar de me esconder. Eu quero vida. Vida que está faltando em mim agora. Vida que não escorre pelo ralo, nem se afina como massa. Vida que trazes escondido em algum canto do corpo. Vida sem cor cinza, nem cheiro de lágrima. Nem tempo parado lá fora.