sexta-feira, outubro 28, 2005

Nucas. Ah! nucas


De todas as partes do seu corpo a que mais admiro é a nuca. Sim, a nuca. Esse pedaço de carne escondido atrás do pescoço. Esse pequeno intervalo entre a cabeça e as costas. Essa pele lisinha e confortável onde bocas repousam suavemente. E a sua nuca é especial porque é sua. Branca, linda, cheirosa, agindo como um ímã na minha direção.
Parece que você sabe o quão interessante é ela. Basta notar suas atitudes para perceber que você sente um certo prazer em ir descendo com suas mãos pelos fios dos cabelos, indo para parar naquela região cômoda e ali permanecendo por minutos, roçando seus dedos longos naquela cavidade bucólica.
Num dia desses fiquei observando seus movimentos, e como você se movimenta! Era um frenesi só: sentava, levantava, mexia, virava, trocava de lado, abaixava, sentava, levantava...e eu lá, na sua nuca, mirando aquela parte do seu corpo se contorcer de um lado para outro, seguindo seus gestos.
Tive por alguns instantes que segurar minha mão rebelde para que ela não cometesse uma ato insano. Ela queria, a todo custo, chegar perto, roçar os dedos, as unhas, ver você se arrepiar, rir da minha audácia em lhe tirar a concentração. Más vai! Quem se importa com coisas sérias quando a mente e o corpo estão pedindo a imprudência.
E a sua nuca é um desacato à autoridade, uma afronta à moral e aos bons costumes, um perigo para mocinhas inocentes e desavisadas, um delírio para lábios, línguas e pontas de dedos, um sério risco para relacionamentos certinhos e metódicos. Ela é um tiro no bom senso, um "pecado original", a luta entre o sagrado e o profano.
Se houvesse a oitava maravilha do mundo ela seria a imagem imortalizada do seu dorso com alguns pêlos ralos e dispersos. Um design dos deuses.
Nada consegue ser tão nocivo quanto sua nuca, ela é um deleite. Sem falar que nucas estão posicionadas numa região estratégica. Independente do caminho a se percorrer, norte ou sul, ela é um oásis no meio da passagem, um lugar para nos refrescarmos, reabastecermos, relaxarmos e prosseguirmos a nossa jornada. Ufa! Ainda bem que nucas não cobram pedágio.
Só quem conhece o prazer de tocar uma nuca macia, brincar com os dedos aquele cantinho inóspito vai entender o que eu estou dizendo e quem não souber não irá encontrá-lo em nenhuma dessas linhas. Então pessoas belas que estão lendo este texto, se você pertence ao segundo time podem passar para outro site, desligar o computador ou ler um livro, é o mais recomendável. Ou melhor procure uma nuca gostosa por aí e tente fazer um test-drive para ver se eu tenho ou não razão

sexta-feira, outubro 21, 2005

La dame Laroceriè


Estávamos todas lá reunidas, novamente. Risos soltos e largos, música alegre ao fundo, copos com líquidos animadores pela metade, um cheiro de nostalgia circulando nossa mesa. Ao que parecia um reencontro entre pessoas que se querem bem e há muito não se vêem era, na verdade, uma despedida de um membro querido da "trupe" que estava nos deixando para alçar novos vôos. Como a vida deve ser.
Mas a peculiaridade daquele momento era a sensação de sermos outra vez como nos velhos tempos. Os tempos adolescentes de vontade simples de ser feliz e muitos projetos em mente. As gigantes contra os moinhos de vento. E depois veio a vida e fez de nós o que quis.
Agora cada qual com as suas amarguras, frustrações, felicidades e conquistas contavam suas peripécias mundo afora. E eu saboreava cada história com especial degustação. O que estava diante de mim era um retrato vivo de como os sonhos podem dar certo, ou como a vida nos arrasta para o chão.
Entre as distintas ocupantes da mesa estavam senhoras de família, com muita responsabilidade, outras mulheres independentes, resolvidas profissional e emocionalmente, outra uma autoridade importante no cenário social, enfim, cada uma com sua alegria particular, mas compartilhando aquele sabor gostoso da amizade que inebria nossas narinas. Era para ser uma despedida sem choro, nem drama e assim transcorreu até o fim. Era para ser um momento de prazer despreocupado e assim foi. Era para ser um momento para ser fotografado pelas lentes da memória e lá está.
Tudo era uma sucessão de fotos, abraços, beijos, pedidos de nunca deixar de mandar notícias. Pedidos de venha nos visitar assim que puder, casa não faltaria, muito menos afeto. Os outros habitantes do lugar nos olhavam instigados, querendo descobrir o que era, o que não era, sobre o que falávamos, o que deixávamos de falar. E nós lá, tomando conta daquele bar/restaurante/pista de dança/boteco.
Não vou me ater aqui ao que sucedeu durante a noite, até porque os assuntos tratados em encontros amigáveis são particulares demais e a proposta deste texto não é essa. O que me levou a sentar diante da tela branca e posar os dedos no teclado freneticamente foi a sensação posterior à tudo isso. Uma terrível sensação de perda. Sim, isso mesmo.
Aqui sozinha, vendo as palavras surgirem na minha frente, um nó atravessou minha garganta e eu não pude conter a lágrima que escorreu teimosa, quente, salgada. Uma sensação de vazio; de sentir mais um a partir para longe do meu foco de visão.
Por mais que a correria do dia-a-dia acabe nos afastando um pouco, temos a certeza de que o outro está a alguns passos de distância, ou a um telefonema básico. É a sensação de, mesmo ausente, sentir a pessoa sempre perto.
A partir de hoje essa distância ficou mais profunda. O que irá nos separar é um oceano salgado e frio. É um fuso horário diferente, é uma cultura de vida distinta. Você acima e eu abaixo da linha do equador (ou será o contrário? Não importa!). O que importa agora é: você tornou-se La dame. La dame Loroceriè.
Um pensamento egoísta atravessou a minha mente, durou só alguns segundo, tempo suficiente para me sentir péssima. Tratei de dissipá-lo. Só não consegui dissipar o choro atrevido. Meus dedos iam de um canto à outro do teclado, mas eu não os sentia, era como se eles se movessem por conta própria, alheios à minha vontade. Por mim, estaria deitada na minha cama, agarrada ao travesseiro, olhando para o teto e chorando abusivamente. Estaria relembrando nossos invernos e verões. Nossos outonos e primaveras. Mas quem controla a situação nesse momento são meus dedos.
Olhei para mim mesma, para os meus dramas pessoais do cotidiano, minha vida provinciana, meus apegos sem garantias de posse e me comparei à você: absurda e impenetrável, como quando aqui permaneceu. Cheia de moral.
E eu pensei "quem diria que aquela pessoinha, sim pessoinha com seus 1,62m de altura pudesse ter tanta coragem de se aventura tão longe, sem nenhuma garantia de sucesso, sem nenhum contrato pré-estabelecido, sem ninguém a quem pedir auxílio num momento de dificuldade". Mas ela tem. E tem de sobra, dá até para me ceder um pouquinho.
O relógio da vida passa rápido, não trava, não quebra, não gasta a bateria, e você soube como poucos aproveitar os minutos que ela nos oferece, sem dar bola para problemas menores, para pessoas menores. Mais uma vez admito: você é absurda!
Sim, eu vou sentir saudades. Uma puta saudade dos seus conselhos, dos seus "carões", da sua impontualidade, da sua amizade tão sincera, tão presente, tão forte. Como seria bom se pudéssemos manter quem amamos sempre por perto, mas cada um tem a sua vida e precisa lutar para mantê-la forte e viva. O outro lado do atlântico se deu bem. A França ganhou uma pequena notável. Au revoir, Cherry!

domingo, outubro 16, 2005

As curiosidades de Capitú


Descendo as escadas ouvi seu nome sendo pronunciado em bocas desconhecidas. Parei. Mesmo atrasada me deixei ficar; queira saber mais sobre você, qualquer informação é válida: onde você mora, com que freqüência sai com os amigos, seus gostos, o que você pensa.
Enfim, tudo é matéria à curiosidades sobre você. Tudo o que vem de você me aguça de uma forma que beira a obsessão. Há muito de exagero nisso, tenho que admitir, mas vale lembrar que estou me referindo à pessoa que fervilha meus hormônios e recheia minhas idéias pouco convencionais, logo esses desvarios são perfeitamente explicáveis.
Estou decidida a entrar na sua vida, nem que seja arrombando a porta, nem que seja pelos fundos, nem que seja na base da pancada. A mim não me importa o fato de não ter recebido o convite dourado para entrar nos seus domínios, tenho cinismo em doses homéricas para ignorar isso, para ignorar inclusive que não existe nem mesmo uma brecha por onde eu posso espiar o que acontece lá dentro.
Tenho que admitir que é mais um capricho do que qualquer outro sentimento. Sei que a partir do momento em que eu estiver entrado vou procurar uma maneira de escapulir, mas por enquanto fica a vontade de entrar.
Portanto, tudo tornou-se trilhas para chegar até você; seus amigos, e-mail, o número do telefone descoberto de maneira ilegal. Eu vasculho tudo, inescrupulosamente. Eu tento chamar a sua atenção, mesmo sabendo que você me ignora e que isso fere o meu orgulho e me irrita profundamente.
Você não faz idéia dos sentimentos negativos que invadem minha cabeça quando percebo suas atenções voltadas para terceiros; eu disfarço, viro a direção do olhar, mudo de assunto, mas você percebe, eu sei que percebe a minha tentativa de invasão, o meu cavalo de Tróia sendo construído na surdina, o meu exército se preparando para o ataque surpresa.
Eu durmo com você todas as noites, eu desejo você e isso grita no meu rosto como se um letreiro com seu nome escrito em letras garrafais estivesse piscando diante de ti. Apostei comigo mesma que faria parte da sua vida, independente do que eu tiver que fazer, os fins justificam os meios, lembra? E de maneira alguma eu posso pensar na possibilidade de perder essa aposta. Afinal como conseguiria me olhar no espelho sem perceber a marca da derrota nos meus cabelos.
Não meu querido, eu não jogo para perder. E você é a bola da vez, e eu tenho que marcar esse gol, mesmo que eu tenha que comprar o árbitro.

sexta-feira, outubro 07, 2005

08h53m


Aquele telefonema me arrancou do presente e me jogou no passado assim, de barriga vazia. De repente eu me vi novamente naquela rodoviária, agarrada ao meu ursinho de pelúcia, chorando todas as lágrimas que uma pessoa consegue chorar. Tentando manter a postura, não demonstrar a dor de estar deixando um pedaço de mim ali, naquele lugar onde o sofrimento está estampado no rosto de todos que pisam o seu solo.
Na minha cabeça eu queria ficar, não queria ir embora, deixar os meus para trás. Não queria. Não queria conhecer um mundo novo, pessoas novas. Queria aquele lugar frio, doentio, e as pessoas que eu tanto amava
Mas aquele telefonema trouxe de volta uma avalanche de sentimentos confusos e não ditos na hora da despedida. Ali, entre cabos telefônicos, estavam se desenrolando anos de lágrimas e solidão. Anos de raiva e palavras rispidamente ditas. Anos de ações que cortaram fundo a carne e que até hoje parecem ainda não estar cicatrizadas. Tantas culpas, tantos desassossegos, tantos fugas da loucura, do vício, do que corrói. Ele me levou novamente aquele lugar vazio com tudo empacotado, embalado, despachado, esperando o momentos da partida. O meu ar de revolta, inconsolável, com ódio do mundo que me pregou uma peça cruel demais para os meus ombros frágeis.
Foi forte demais para uma nascer do dia. Ninguém conseguiu conter as lágrimas ininterruptamente caídas, rolando na face. Aquela vontade de querer voltar no tempo para recomeçar no ponto havíamos parado, para tentar, pelo menos evitar tanto desacerto, ou pelo menos para tentar enxergar em que curva os vagões se soltaram e cada um foi para um canto.
Mas é estranho visitar um passado que você sempre escondeu de você mesmo, que tentava ignorar, um passado que você não sabia se queria ou não esquecer. Foi difícil tomar nota de tudo aquilo num gole só. Foi difícil não levar minha mente de volta aquele cantinho perdido num ponto do universo onde tantas coisas boas foram celebradas e onde a parede rachou de forma estranha.
Até a voz do outro lado da linha era estranha, ou melhor, irreconhecível. Nos percebemos divididos em dois blocos opostos, que seria difícil descrever aquele sentimento que escorria no meu corpo enquanto ouvia você falar. E eu senti medo do passado, medo de você ali do outro lado da linha, mesmo separada por quilômetros de distância. Eu senti medo de falar com você, de não saber o que dizer. Eu só conseguia soltar um riso meio bobo de quem não está presa ao chão.
No fundo eu quis dizer tanta coisa. Quis dizer que eu também te amava, mas não consegui. Ficou entalado na garganta, sem saber por onde escapar. Quis dizer que sentia falta de nós, de tudo juntos, daqueles tempos onde éramos como mosqueteiros, éramos somente nós contra o resto do mundo, o terrível mundo. Quis dizer que eu ainda não entendi bem o que aconteceu conosco, como fomos ficar daquele jeito, mas que no fundo eu queria o nosso passado de volta, que ele me fazia tanta falta, uma saudade insuportável, uma dor aguda na memória. Eu quis dizer que ainda me lembrava das brincadeiras, das brigas, nossos amigos, enfim, das nossas vidas. Mas eu não consegui. Eu não consegui dizer nada, só ouvia o seu choro do outro lado da linha, um choro arrependido, inconsolável, um choro assim como o meu, de quem quer o passado de volta. Um choro de quem quer o impossível.
Aquele telefonema mudou o meu dia, a minha vida. Ter tido notícias suas foi como restabelecer o contato com algo perdido no tempo. Não sei como será daqui para frente. Se iremos parar por aqui, ou daremos uma chance a nós mesmos, sem estarmos ainda preparados para isso. Só sei que as notícias que você trouxe sacudiram fundo aqui dentro de mim e me deram uma outra perspectiva de futuro.